Rádios do RS analisam jogos da Copa em dialetos europeus
por Vanessa Kannenberg
Emissora de Bento Gonçalves transmite informações no dialeto italiano vêneto e em Westáflia, outra rádio divulga as notícias em sapato-de-pau, derivado do alemão. Ambas pelas ondas do rádio e também na internet
Em Bento Gonçalves, emissora vai fazer concentração em cantina com comida típíca italiana em jogos da Itália - Foto: Cesar Lopes / Especial |
A Copa do Mundo volta ao Brasil depois de 64 anos, mas nem por isso tudo é verde e amarelo por aqui. A partir desta quinta-feira, com o apito inicial do campeonato, pelo menos duas rádios gaúchas dão o pontapé em programações especiais sobre o Mundial em dialetos europeus.
Mais do que isso, o alemão sapato-de-pau e o italiano vêneto são referências até mesmo fora do país, mas que correm risco de se perder na globalização da cultura. E tem muita gente esperando pra conferir as transmissões especiais.
Assista ao vídeo com um programete gravado nos dois dialetos com tradução para o português:
A Copa em sapato-de-pau
Pelas ondas da Rádio Líder FM, na frequência 98,3, em Westfália, no Vale do Taquari, a comunidade descendente de alemães vai ouvir boletins ao longo da programação em Plattdüütsch, ou, simplesmente, sapato-de-pau. No município, o criador, proprietário e locutor da rádio comunitária, Ido Ahlert, 57 anos, estima que mais da metade da população de 2,8 mil habitantes entenda o dialeto.
— Muito já se perdeu, mas 60%, se não fala, ao menos entende. E tem muitos moradores, principalmente, os mais idosos, que só querem conversar em sapato-de-pau. Eles me ligam e pedem: jamais pare com o programa — comenta, orgulhoso, o comunicador.
Isso porque, mesmo fora do período da Copa, Ahlert mantém dois programas, um aos domingos de manhã, bilíngue, e outro nas segundas à noite, em sapato-de-pau, com informações, mensagens e música.
Ahlert fundou a rádio há cinco anos e mantém estúdio em casa - Foto: Cesar Lopes |
A iniciativa já lhe rendeu convites para ir a Alemanha, conduzir programas no dialeto, e, depois de estrelar o episódio O locutor da série comercial Brasileiros de Coração, do Banco Itaú, Ahlert também foi chamado por rádios nacionais para comentar a Copa.
— Não aceitei nada, porque meu lugar é aqui, junto da minha família e fazendo o que faço para agradar à comunidade. Tenho ouvintes fiéis também em outros Estados e fora do país, é pra eles que me dedico — resume Ahlert, já que a rádio, que fica no ar das 6h às 22h, é transmitida ao vivo pela internet.
Tendo aprendido com os pais e avós, e jamais na escola, o locutor desconhece como se escreve o sapato-de-pau ou até mesmo o alemão oficial, idioma que também domina. Mas está frequentando aulas sobre o dialeto, a cada dois meses, porque a vontade de ir além nunca acaba.
A Copa em vêneto
Da mistura do italiano oficial com o português, surgiu o vêneto, também chamado de talian, disseminado pelos imigrantes principalmente na serra gaúcha. O resultado, para os leigos, são frases fortes e cantadas formadas por várias palavras facilmente captadas por brasileiros. Esse é o dialeto que faz da Rádio Viva AM, 1070, de Bento Gonçalves, uma referência nacional graças à internet.
Nos anos 1980, a emissora chegou a ser 100% transmitida em vêneto. Mas a resistência de alguns foi fazendo com que o dialeto fosse perdendo espaço e, hoje, se resume a um programa diário de duas horas e outro aos domingos. O grande diferencial, implementado no início dos anos 1990, continua: transmissões de partidas importantes de futebol totalmente em vêneto.
— Já transmitimos a Copa da África, Libertadores, Copa do Brasil e todos os Gre-Nais e jogos importantes da região, sempre com muito humor — comenta um dos locutores da rádio, Itair Luiz Baldissera, 80 anos.
Ao lado de Rizzo, Pedro Vitor Rizzo, 58 anos, completa a dupla responsável pelas transmissões esportivas da Rádio Viva, de Bento, há duas décadas. Embora sejam só dois locutores, a inclusão de personagens, como a Nona Bambina, o Nono Nani e o Cigano, complementam as bem humoradas jornadas.
— Não temos a obrigação do jornalismo e da técnica nas jornadas, por isso não narramos lance a lance e conseguimos fazer só os dois. Abusamos do humor, de piadas e até cantamos durante os jogos, acho que é isso que cativa o público — completa Rizzo.
Pedro Vitor e Baldissera narram jogos em vêneto há duas décadas - Foto: Cesar Lopes |
Nesta Copa, a emissora não poderá narrar a partida em vêneto, devido aos direitos de transmissão. Mas achou um jeito muito criativo de manter a tradição: nos dias de jogos da Itália, antes do início da partida, vai reunir locutores e ouvintes numa cantina, servirá queijo, salame e outros quitutes típicos italianos, junto de suco de uva e vinho.
A concentração vai ser transmitida ao vivo pela rádio, com informações, palpites e humor em vêneto. No resto da programação, boletins e informações, também no dialeto, para a audiência acompanhar a Copa. E a torcida, é italiana ou brasileira?
— Tenho uma frase que virou bordão da rádio: o sangue é italiano e o coração é brasileiro. A gente torce em primeiro lugar pro Brasil e achamos que vamos ganhar. Mas se o Brasil não joga, a torcida é toda para a Itália — esclarece Rizzo.
Fonte: ZH
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