Apresentação

O Forlibi surgiu da necessidade de unir as línguas brasileiras de imigração com o objetivo de instaurar um diálogo permanente entre estas comunidades linguísticas, e se propõe a ser um espaço de pesquisa, mediação e articulação política em variadas frentes para o fortalecimento das mesmas. Reunindo falantes e representantes das línguas de imigração e de instituições parceiras, tem como propósito delinear ações coletivas para a promoção das línguas nas políticas públicas em nível nacional.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

IPOL realizará formação de recenseadores para o censo linguístico do município de Antônio Carlos-SC

IPOL realizará formação de recenseadores para o censo linguístico do município de Antônio Carlos-SC

Nos dias 10 e 11 de fevereiro, o IPOL realizará em Antônio Carlos-SC a formação dos recenseadores que atuarão no censo linguístico do referido município. A formação é uma parceria entre o IPOL e a Secretaria de Educação e Cultura de Antônio Carlos.

Localizada a 32 km de Florianópolis e com uma população de 7.906 habitantes, segundo o IBGE (2010), Antônio Carlos foi a primeira cidade do Estado de Santa Catarina a aprovar uma lei cooficializando uma língua de imigração, o Hunsrückisch. A cooficialização foi aprovada, por unanimidade, por sua câmara municipal, em 09/02/2010, depois de muitas reuniões e da realização de três audiências públicas (ver documento com a lei aqui).

Antônio Carlos é também um dos 14 municípios brasileiros (ver tabela abaixo) a empunhar uma política linguística de reconhecimento da história e da língua de grande parte de sua população como forma de aprofundar os vínculos identitários e planejar ações de desenvolvimento social e econômico pautado pelo fortalecimento das iniciativas locais.


Iniciativa semelhante foi realizada em Santa Maria de Jetibá, no Espírito Santo, que cooficializou também em lei municipal a língua pomerana em 2009 (ver texto da lei aqui), o que desencadeou uma série de ações, dentre as quais a realização do censo linguístico, protagonizado pela secretaria de educação do município em parceria com o IPOL.

“Com a cooficialização do Hunsrückisch em Antônio Carlos”, afirma Rosângela Morello, coordenadora-geral do IPOL, “tem início outra etapa em prol da regulamentação da lei e da implementação de ações para ampliar os âmbitos de usos da língua. São ações que visam a legitimar processos históricos da imigração no Brasil, reconhecendo sua importância na formação da sociedade brasileira”. Rosângela nos lembra também que a região onde atualmente se localiza o município era ocupada por indígenas Xokleng. A partir de 1830 recebeu imigrantes oriundos da região do Hunsrück, sudoeste da Alemanha, como aconteceu em outras localidades no Rio Grande do Sul (Ivoti, Sapiranga, Bom Princípio, Novo Hamburgo, Nova Hartz, Araricá, Presidente Lucena, Morro Reuter). A partir de 1840, açorianos acompanhados de escravos negros também se instalaram na região. Anos mais tarde, libaneses, ingleses e belgas também se estabeleceram no município. “Toda essa diversidade na formação de Antônio Carlos provavelmente é refletida nas línguas faladas por seus habitantes. É a valorização desse patrimônio linguístico que está no âmago da iniciativa de cooficializar a língua Hunsrückisch ou simplesmente ‘Hunsrücke’”, complementa Morello.

Para o levantamento de dados linguísticos no município, preveem-se duas etapas: o censo linguístico, que produzirá indicadores sobre a língua Hunsrückisch permitindo visualizá-la em suas funções básicas sociais e assim subsidiar e fundamentar a tomada de decisões sobre ela, e o diagnóstico sociolinguístico, que aprofundará o conhecimento sobre os usos do Hunsrückisch em Antônio Carlos, sobretudo quanto à sua modalidade escrita. Ambas as etapas poderão orientar a adoção de uma perspectiva para o ensino da língua no município, por exemplo, ou outras políticas linguísticas com vistas à preservação do patrimônio linguístico – oral e escrito – da cidade.

As próximas etapas do censo linguístico serão a formação dos digitadores e a coleta de dados.

Fonte: e-Ipol

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Registro da Língua Talian como Patrimônio Cultural no Brasil é destaque no Jornal Nacional

Registro da Língua Talian como Patrimônio Cultural do Brasil é destaque no Jornal Nacional

Reportagem do Jornal Nacional (Rede Globo) de 31 de janeiro destacou o registro da Língua Talian como Patrimônio Cultural do Brasil. O Talian, juntamente com as línguas Guarani Mbya e Asurini do Trocará, são as primeiras línguas reconhecidas como Referência Cultural Brasileira pelo Iphan - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (ver notícia aqui) e agora fazem fazer parte do Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL). Essas línguas bem como os representantes de suas comunidades foram homenageados durante o Seminário Ibero-Americano de Diversidade Linguística, em Foz do Iguaçu-PR, no dia 18 de novembro do ano passado (ver notícia aqui).

Assista o vídeo com a reportagem aqui ou visualize abaixo.


Abaixo replicamos a notícia publicada no portal G1.

Dialeto derivado do italiano vira patrimônio cultural no Brasil

O Talian é falado por cerca de meio milhão de pessoas, principalmente no sul do país, e já tem até dicionário com mais de 40 mil verbetes.

Desde o fim do ano passado o Brasil tem um novo dialeto registrado como Patrimônio Cultural.

No jogo de cartas, quem será que está ganhando? Impossível saber, a menos que você entenda talian.

“A gente pegou hábito e fala o italiano e continua com o italiano",  diz um dos frequentadores da roda.

Eles e cerca de meio milhão de pessoas no país. Programas em talian vão ao ar em mais de 200 rádios brasileiras. Afinal, o dialeto nasceu aqui mesmo, depois da vinda dos imigrantes da Itália para o país.

"Essa mistura de dialetos do Norte e Nordeste da Itália com o português deu origem aquilo que hoje chamamos de talian", explica o professor Darcy Luzzatto.

O professor Darcy é autor do dicionário de talian, que tem mais de 40 mil verbetes, e prepara a primeira gramática da língua, que é comum principalmente no Sul do país. Em Serafina Corrêa, na Serra Gaúcha, o dialeto é a segunda língua oficial da cidade.

“Tem os nonos, que se sentem mais acolhidos quando a gente fala o dialeto com eles”, explica a vendedora Odete Lazzarotto.

Mas nem sempre foi assim. Nos anos 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, os cidadãos brasileiros foram proibidos de falar qualquer idioma vindo de países inimigos. E a Itália era um desses países. Por isso, imigrantes e descendentes passaram a ser vigiados pela polícia, para que não descumprissem a lei.

O nono Etelvino, patriarca da família Bazzo, conta que a lei durou pouco tempo, mas deixou uma herança de preconceito.

“Chamavam colono grosso porque ele não sabia falar ‘brasileiro’”, conta.

Por isso, o reconhecimento do dialeto como língua e referência cultural brasileira pelo Ministério da Cultura (MinC) no fim do ano passado pode ajudar a manter o talian vivo também entre os jovens.

“Sendo uma língua oficial, há um status diferente. Traz orgulho e traz uma consciência de que é uma outra língua, que não é o português. Se se fala o talian, se preserva toda essa cultura da imigração italiana no Brasil”, destaca Paulo Massolini, presidente da Federação das Associações Ítalo-Brasileiras do RS.

Fonte: G1

Notícias relacionadas:

Língua vai virar patrimônio cultural (reportagem veiculada em telejornal do SBT-RS em 19/11/2014)


Língua de imigrantes italianos se torna patrimônio brasileiro (reportagem veiculada no Jornal Hoje em 20/11/2014)


Fonte: e-Ipol.org

domingo, 25 de janeiro de 2015

A diversidade linguística como patrimônio cultural


Foto: Marcello Casal Jr_ABr
A diversidade linguística como patrimônio cultural

Ministério da Cultura inicia, por meio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, política de reconhecimento das diferentes línguas e dialetos falados no Brasil através de processos de inventários, apoio a pesquisas, divulgação e promoção

Marcus Vinícius Carvalho Garcia

A diversidade linguística encontra-se ameaçada. Estima-se que entre um terço e metade das línguas ainda faladas no mundo estarão extintas até o ano de 2050. As consequências da extinção das línguas são diversas e irreparáveis, tanto para as comunidades locais de falantes, quanto para a humanidade. Essa percepção se encontra na Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, elaborada na cidade de Barcelona, Espanha, em 1996, sob os auspícios da Organização das Nações Unidas Para Educação e Cultura (Unesco) e com a participação de representantes de comunidades linguísticas de diversas regiões do planeta. Segundo este documento, a situação de cada língua é o resultado da confluência e da interação de múltiplos fatores político-jurídicos, ideológicos e históricos, demográficos e territoriais; econômicos e sociais. Salienta que, nesse sentido, existe uma tendência unificadora por parte da maioria dos Estados em reduzir a diversidade e, assim, favorecer atitudes adversas à pluralidade cultural e ao pluralismo linguístico.


O Brasil figura entre os países de maior diversidade linguística. Estima-se que, atualmente, são faladas mais de 200 línguas. A partir dos dados levantados pelo Censo IBGE de 2010, especialistas calculam a existência de pelo menos 170 línguas ainda faladas por populações indígenas. Embora não contabilizadas pelo Censo, pesquisas na área de linguística também apontam para outras línguas historicamente “situadas” e amplamente utilizadas no Brasil, além das indígenas: línguas de imigração, de sinais, de comunidades afro-brasileiras e línguas crioulas. Esse patrimônio cultural é desconhecido ou mesmo ignorado por grande parte da população brasileira.

A historiografia do país demonstra que foi necessário considerável esforço do colonizador português em impor sua língua pátria em um território tão extenso. Trata-se de um fenômeno político e cultural relevante o fato de, na atualidade, a língua portuguesa ser a língua oficial e plenamente inteligível de norte a sul do país, apesar das especificidades e da grande diversidade dos chamados “sotaques” regionais. Esse empreendimento relacionado à imposição da língua portuguesa foi adotado enquanto uma das estratégias de dominação, ocupação e demarcação das fronteiras do território nacional, sucessivamente, em praticamente todos os períodos e regimes políticos. Da Colônia ao Império, da República ao Estado Novo e daí em diante.

Tomemos como exemplo o nheengatu, uma língua baseada no tupi antigo e que foi fruto do encontro, muitas vezes belicoso e violento, entre o colonizador e as populações indígenas da costa brasileira e de grande parte da Amazônia. Foi a língua geral de comunicação no período colonial até ser banida pelo Marquês de Pombal, a partir de 1758, caindo em pleno processo de desuso e decadência a partir de então. Foram falantes de nheengatu que nominaram uma infinidade de lugares, paisagens, acidentes geográficos, rios e até cidades. Atualmente, resta um pequeno contingente de falantes dessa língua no extremo norte do país. É utilizada como língua franca em regiões como o Alto Rio Negro, sendo inclusive fator de afirmação étnica de grupos indígenas que perderam sua língua original, como os barés, arapaços, baniwas e werekenas.

Processo similar, ou mais opulento ainda, ocorreu com a infinidade de línguas faladas na África e que foram também faladas no Brasil devido ao tráfico transatlântico. Línguas dos troncos ewe-fon, nagô-iorubá e, principalmente, as bantu foram sendo absorvidas pela língua portuguesa em processo similar ao ocorrido com as línguas indígenas, porém, deixando também sua influência principalmente na fonética, na onomástica e no vocabulário do português brasileiro.

Em outro plano, o Estado Novo, sob o comando de Getulio Vargas, também adotou medidas que geraram impactos nas línguas e culturas das famílias e comunidades imigrantes que chegaram ao Brasil em fins do século XIX. Havia a preocupação, de fundo racialista, com a manutenção da hegemonia da cultura brasileira forjada a partir dos moldes lusitanos. Temia-se a possibilidade de ebulição de movimentos separatistas, que se suspeitava poder aflorar nas colônias de imigrantes japoneses, alemães, italianos, poloneses, ucranianos, entre outras. Foi a escola o principal instrumento de imposição, onde se tornou obrigatório o ensino da língua portuguesa, desestimulando-se, ao mesmo tempo, o aprendizado e a utilização das línguas faladas pelo imigrantes.

Pode-se afirmar que é relativamente recente, do ponto de vista do Estado brasileiro, e mesmo dos Estados nacionais de modo geral, tratar a diferença étnico-cultural e linguística no campo dos direitos humanos. E isso envolve a percepção de que falar ou não determinada língua materna tem que ser uma escolha dos indivíduos, das famílias e das comunidades. Cabe, desse modo, ao Estado, tão somente garantir a liberdade dessa escolha e fomentar políticas voltadas para garantia desse direito.

Línguas como Patrimônio
Na última década tem havido grande mobilização de grupos, de organizações de falantes e de pesquisadores no sentido de associar a diversidade linguística como temática inerente a políticas de cultura, mais especificamente na esfera do chamado patrimônio imaterial. Essa mobilização motivou a elaboração do Decreto Presidencial 7.387/2010, que instituiu o Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL). O INDL nasce como política interministerial envolvendo Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação (MCTI), Ministério da Educação (MEC), Ministério do Orçamento e Gestão (MPOG), Ministério da Justiça (MJ), sob coordenação atual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), enquanto representante do Ministério da Cultura. Tem como princípios reconhecer as línguas como referência cultural brasileira, valorizando o plurilinguismo; apoiar os processos sociais e políticos que visem à promoção das línguas e de suas comunidades de falantes; pesquisa e documentação, bem como gerir um banco de conhecimentos sobre a diversidade linguística.

Um dos principais desafios para o reconhecimento das línguas minoritárias é constituir, com isso, direitos linguísticos, bem como a elaboração de estratégias que visem instrumentalizar as populações de falantes na preservação e na transmissão de seu patrimônio linguístico. Segundo Célia Corsino, diretora do Departamento do Patrimônio Imaterial/IPHAN, outro desafio é fazer do Inventário Nacional da Diversidade Linguística um instrumento includente e não discricionário, de modo que seja possível se inscrever no INDL todas as línguas faladas no Brasil, em sua plenitude ediversidade.

Importa salientar que a abordagem que o IPHAN está desenvolvendo para lidar com a complexidade desse tema é pautada na autodeclaração e na anuência dos grupos e comunidades de falantes, de modo que se aborde as línguas enquanto elementos de interesse cultural e de afirmação de identidades. Trata-se de uma estratégia voltada para a percepção do fenômeno linguístico enquanto produto de diversos fatores de ordem sociopolítica e não necessariamente como objeto de estudo de uma área acadêmica – a linguística –, que possui cânones e metodologias específicas de catalogação e classificação que nem sempre são inteligíveis para ospróprios falantes.

No entanto, acredita-se que o advento da política patrimonial da diversidade linguística chame a atenção para a necessidade de se ampliar os estudos de corte sociolinguísticos, de modo que seja possível levantar com mais exatidão quantas e quais são as línguas faladas no Brasil, bem como qual o tamanho do contingente populacional e quais as necessidades dos grupos de falantes que faz do Brasil um dos principais celeiros do plurilinguísmo na contemporaneidade.

O Vêneto Brasileiro
Outro caso relevante é o talian, uma língua forjada a partir do encontro, ocorrido em terras brasileiras, de imigrantes falantes de dialetos da região do Vêneto, na atual Itália, e que possui expressivo contingente de falantes no sul do Brasil. Atualmente, as línguas e os “modos de fazer” das comunidades que utilizam o talian são mais encontrados nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Há municípios, como Serafina Correa, no Rio Grande do Sul, em que o talian é língua oficial, assim como o português.

Estudos do Grupo de Trabalho da Diversidade Linguística (GTDL) aproximam estatísticas sobre cerca de 500 mil pessoas utilizarem o idioma no Brasil, em diversas regiões. Inclusive, há estações de rádio na região Sul e no sul da região Centro-Oeste em que se transmitem programas em italian. No Rio Grande do Sul, o idioma já é patrimônio cultural imaterial oficial. Ainda sobre a disseminação da língua, em 2013 foi lançada a revista Talian Brasil (talian.net.br). Alora, ou então, como se diz em português, não há motivos para não catalogar o máximo possível a cultura trazida por essas comunidades, pois o idioma já é considerado uma língua nacional brasileira (fonte: revista Talian Brasil).

A Sobrevivência dos Pomeranos
Ocorrem no Brasil atual casos como o da língua falada pelos pomeranos, que imigraram para o Brasil devido à Segunda Guerra Mundial, e que conseguiu manter-se viva em pequenas comunidades do Rio Grande do Sul e do Espírito Santo. Essa língua, em pleno uso e transmissão no Brasil, não é mais falada na Europa Central, sua região de origem. Após a guerra, a região onde ficava Pomerode foi incorporada à Polônia pela força do regime soviético. Quanto à etnia dos pomeranos, praticamente foi extinta e os sobreviventes dispersados pela Polônia. Mas a língua permanece viva no Brasil.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Moradores tentam resgatar dialetos 'esquecidos' no sul do país

Moradores tentam resgatar dialetos 'esquecidos' no sul do país

Felipe Bächtold

Aula em escola municipal em Serafina Corrêa (RS), onde o talian
 passará a ser ensinado nos colégios - Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress.
Em uma pequena cidade do Rio Grande do Sul, funcionários da prefeitura são orientados a falar "sorasco" em vez de "churrasco" e "sinele" no lugar de "chinelo".

Por enquanto, isso ocorre uma vez ao ano: na semana em que se comemora a emancipação da cidade de 16 mil habitantes. Por enquanto.

Ameaçado de extinção, o talian, uma espécie de variação do italiano, só agora começa a ter gramática, dicionário e aulas. E a cidade de Serafina Corrêa, na serra gaúcha, virou um bastião na luta para preservar esse idioma.

Mas não é a única. Outras comunidades pelo Sul do país também se mobilizam para manter vivos dialetos europeus hoje quase restritos a regiões rurais e a idosos.

Em Serafina Corrêa, o talian virou por lei idioma "cooficial" e é incentivado das mais diferentes maneiras. Programas de rádio, uma revista e atividades culturais no idioma tentam manter vivo o interesse da população pelo dialeto, que foi trazido por imigrantes há mais de um século e se modificou devido à influência do português.

Em breve, a prefeitura irá oferecer aulas do idioma nas escolas municipais.

Os adultos que hoje moram na parte central da cidade pouco usam o dialeto. E o antigo costume de transmitir o conhecimento do idioma de geração a geração foi se perdendo nas últimas décadas.

"Eu sei falar tudo e a minha filha me cobra porque não ensinei. Hoje não tenho mais com quem falar [o talian]", diz Fátima Tecchio, 49.

Em novembro, após receber da cidade um inventário, o Ministério da Cultura reconheceu o talian como Referência Cultural Brasileira, o que deu fôlego a entusiastas.

Um deles é a servidora Solange Soccol, 59, que criou cartilhas sobre o idioma. "Sem a língua, não temos a nossa identidade, nossa tradição", afirma.

Obstáculos
O trabalho de resgate do idioma enfrenta dificuldades como a falta de um modo padronizado de escrever. Como outras línguas de colonos, o talian é ágrafo, ou seja, se desenvolveu sem escrita.

Outro obstáculo é um trauma coletivo da época da Segunda Guerra Mundial (1939-45), quando o governo de Getúlio Vargas proibiu idiomas estrangeiros em território brasileiro. Moradores idosos relatam que a perseguição bloqueou o uso no dia a dia e desestimulou o ensino.

"Quem falava em dialeto na escola ganhava castigo", diz Rosalina Vitalli, 77.

Ela vive em um distrito a 20 km do centro da cidade, onde o talian ainda é o idioma mais falado. Nesse último reduto do idioma, o português é chamado de "brasileiro".

Cássia Gollo, 27, descendente de italianos,
com a família - Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress.
Para a moradora Cássia Gollo, 24, os mais jovens têm mais vergonha de se expressar na língua dos avós. "Parece que têm um pouco de receio [de falar], que querem ser como os das cidades."

Apesar de Serafina Corrêa ser uma capital informal do talian, cidades de todo o Sul já receberam encontros anuais, promovidos por descendentes de italianos, para divulgar a língua.

A professora de ciências sociais Maria Catarina Zanini, da Universidade Federal de Santa Maria (RS), afirma que o talian surgiu no Brasil para facilitar a comunicação entre grupos vindos da Itália.

"Quando saíram de lá, os imigrantes não se entendiam: uns falavam o dialeto vêneto, outros o cremonese. Então, criaram uma língua."

'Sapato de Pau'
Desde 2010, um inventário produzido pelo governo federal busca catalogar os idiomas falados pelo país. Estima-se que existam mais de 250, a maioria indígenas.

A 100 km de Serafina Corrêa, na cidade de Westfália, o esforço é pela preservação de uma variação do alemão chamada de plattdeutsch.

O dialeto tem o apelido de "sapato de pau" devido aos tamancos que os imigrantes alemães usavam na época da colonização. Voluntários promovem programas de rádio e oficinas para o ensino da língua, que também não tem padronização escrita.

O município de Santa Maria do Herval (a 73 km de Porto Alegre) desde 2011 oferece nas escolas aulas de hunsrik, uma língua próxima do alemão falada por descendentes em vários Estados do país.

Hoje, 14 turmas até a 5ª série aprendem o dialeto. "Isso aumentou a autoestima da comunidade e a integração entre gerações. Se a língua não for mantida nas famílias, vai desaparecer", diz a professora Solange Johann, que coordena o projeto.

"Eu falo a língua que amo, banhada de tempo, trabalho e honra. A língua que os avós, hoje guardiães do céu, trouxeram como semente de vida. E foi um grande sacrifício manter por mais de cem anos. Mas aqui me dizem que ninguém entende, que estou arranhando os muros e que devo mudar a pronúncia. Que [se diz] 'eu me chamo' e não 'ni me ciamo' porque minha língua não existe. Mas eu devo, por acaso, sacrificar a minha língua para um deus sem piedade? Esses conselhos nem são esperança e são vazios de dignidade."

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Rosângela Morello em entrevista sobre diversidade linguística ao programa Páginas de Português da RTP

Rosângela Morello em entrevista sobre diversidade linguística ao programa Páginas de Português da RTP

Fala de Rosângela Morello na entrega do diploma de reconhecimento da língua indígena Guarani Mbya no Seminário de Foz do Iguaçu (Fonte: Facebook de Maria Ceres Pereira)
A coordenadora-geral do IPOL, Rosângela Morello, concedeu uma entrevista o programa Páginas de Português, transmitido pela Rádio Antena 2, da Rádio e Televisão de Portugal (RTP).

O tema da entrevista é a importância do I Seminário Ibero-Americano de Diversidade Linguística, realizado em Foz do Iguaçu-PR, mês passado. Na entrevista, Morello destaca a importância do evento tanto como uma política de reconhecimento e conhecimento das línguas brasileiras por parte do Estado brasileiro, quanto de diálogo com outros países com suas respectivas iniciativas políticas concernetes à diversidade das línguas. A entrevistada discorre também sobre questões como o Inventário da Diversidade Línguística (INDL) e a cooficialização de línguas nos municípios brasileiros, a importância do espanhol nas regiões de fronteira entre o Brasil e países vizinhos, além da difusão e do futuro da língua portuguesa no mundo.

Ouça a íntegra da entrevista aqui

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Patrimônio, língua talian luta para sobreviver no Brasil

Patrimônio, dialeto talian luta para sobreviver no Brasil

Os descendentes dos imigrantes italianos tentam manter o dialeto talian vivo.

Língua falada por descendentes de italianos é forte no sul do país

Por Tatiana Girardi

Os descendentes dos imigrantes italianos que chegaram ao Brasil nos séculos passados conseguiram um reconhecimento inédito: ver o dialeto talian ser considerado uma "Referência Cultural Brasileira" pelo Ministério da Cultura.

Com origens no norte da Itália, de onde a maioria dos italianos veio para povoar a região sul e sudeste do Brasil, o dialeto também é conhecido como o "vêneto brasileiro". Porém, o que é falado atualmente no país é uma verdadeira mistura de diversos dialetos italianos das regiões da Lombardia, Trentino Alto-Ádige, Piemonte, Toscana e, claro, do Vêneto.

Apesar do reconhecimento, o medo de perder a tradição é grande. Isso porque muitos jovens, por vergonha ou por receio, não aprendem a língua. Para Aliduino Zanella, presidente da Federação de Entidades Ítalo-Brasileiras do Meio-Oeste e Planalto Catarinense (Feibemo) e mestre e pesquisador de talian, esse receio foi causado pelo governo de Getúlio Vargas.

"É uma consequência do período em que era proibido falar os idiomas que não fossem o português. Os pais, receosos, não mais repassaram aos filhos essa língua cultural", destacou Zanella.

O especialista se refere a uma lei promulgada em 1940 que proibia qualquer cidadão brasileiro de falar um idioma que envolvesse "os países inimigos" na Segunda Guerra Mundial: Alemanha, Japão ou Itália. Com isso, os descendentes e os imigrantes eram vigiados por policiais e todo o material sobre sua cultura era queimado.

Mesmo as pequenas cidades do interior do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul sofreram com a pressão policial. Isso fez com que a tradição da língua fosse se perdendo com o tempo.

Mas nem tudo está acabado para as novas gerações. Para Jaciano Eccher, que tem um blog sobre tradições italianas, o "Italiani in Brasile", e produz programas em talian para rádios, o reconhecimento do dialeto fez bem para a cultura no Brasil.

"Depois que foi reconhecido, a procura entre jovens pelo dialeto aumentou. Eles têm entre 17 e 29 anos e querem manter a tradição. Se nós não batalharmos pelo talian, poderemos ser a última geração a usar o dialeto", destacou Eccher.

De acordo com Ubiratan Souza, professor de italiano e especialista em dialetos, o reconhecimento também é uma "relevante notícia que apareceu em um momento oportuno".

"Vivemos um momento em nosso país que as minorias étnicas tem recebido atenção especial do governo nos últimos anos. É um modo de dar visibilidade ao talian", ressaltou.

Tanto Souza como Zanella destacam, porém, que é preciso que o dialeto seja colocado na grade curricular de escolas para conscientizar as pessoas da importância dessa língua falada pelos imigrantes.

"É preciso um esforço maior entre o governo e as instituições brasileiras e italianas para não perder esse pedaço importante da história entre os dois países", destacou Souza.

Segundo o presidente da Feibemo, atualmente "são mais de 300 programas de rádio que transmitem a língua e a cultura talian".

Uma das dificuldades para ensinar o talian é que o dialeto não tem uma única grafia. No entanto, segundo Eccher, os líderes dos grupos que querem preservar a língua têm tentado compilar em dicionários todos os verbetes. Ele mesmo está escrevendo um exemplar que inclui a versão do italiano gramatical para cada palavra.

"O dialeto cria o sentimento de pertencimento, identifica e coloca o indivíduo na dimensão precisa de sua história pessoal. É um patrimônio cultural para ser defendido", ressaltou o professor Souza.

Ele ainda conta uma curiosidade sobre uma das palavras mais usadas por todos os brasileiros.

"A palavra "tchau" usada em português se refere ao "ciao" usado pelos descendentes do vêneto quando eles eram rejeitados pelos brasileiros", disse.

E a luta que levou ao reconhecimento do talian pelo MinC pode ser a porta para o reconhecimento de outros dialetos. Segundo a Unesco, no Brasil são falados 210 idiomas por minorias, sendo que 70 deles têm alguma relação com os imigrantes de vários países que vieram para o Brasil ao longo dos séculos. 

Fonte: ANSA Brasil

domingo, 14 de dezembro de 2014

Abertas inscrições de trabalhos para o Simpósio "Educação Intercultural e Diversidade Linguística"

Abertas inscrições de trabalhos para o Simpósio "Educação Intercultural e Diversidade Linguística" 

Estão abertas as inscrições de trabalhos para o Simpósio "Educação Intercultural e Diversidade Linguística", a ser realizado no III Encuentro de las Ciencias Humanas y Tecnológicas para la integración de la América Latina y el Caribe, a se realizar nos dias 07 a 09 de maio de 2015, em Goiânia-GO.

Coordenado pelos professores Erineu Foersteb (UFES), Rainer Enrique Hamel (Universidade Autônoma Metropolitana do México) e Rosângela Morello (coordenadora-geral do IPOL), o simpósio tem como data limite de postagem dos resumos o dia 01º de janeiro e de postagens dos trabalhos completos o dia 31 de janeiro. O endereço para postagem tanto dos resumos quanto dos trabalhos completos é simposiogoiania2015@yahoo.com.br 

Simpósio 40 – Educação Intercultural e Diversidade Linguística (ver pdf aqui)

RESUMO: A América Latina e Caribe apresentam indiscutível diversidade de culturas e línguas. Tal fenômeno remete-nos aos Povos Tradicionais e seus respectivos territórios, como: indígenas, quilombolas, ciganos, pomeranos etc. Em suas lutas históricas de resistência, criaram condições concretas para a preservação do seu capital linguístico. Desse processo de resistência popular, construíram-se pedagogias alternativas, através das quais as culturas puderam ser aos poucos reconhecidas e mantidas. A educação escolar oficial pouco trabalhou esta problemática. Esforços teóricos e práticos dialéticos inovadores e transformadores foram produzidos, porque acadêmicos problematizam, juntamente com os Povos Tradicionais, a ausência de políticas culturais e linguísticas referenciadas às etnias e grupos minoritários. Promove-se educação intercultural bilíngue. Trata-se de favorecer diálogo entre as culturas (Paulo Freire e Enrique Dussel), para fortalecer processos emancipatórios que contribuem à organização política coletiva de todos como sujeitos de direitos na diversidade. Neste simpósio, em um eixo, discute-se interculturalidade como práxis, pois fundamenta, entre outros aspectos: a) lutas coletivas por direitos sociais dos excluídos; b) processos de resistência coletivos ao projeto hegemônico internacional de progresso e desenvolvimento das elites econômicas; c) produção coletiva de outra hegemonia (Gramsci), como práticas educativas diferenciadas, que promovem transformações da sociedade de classes. Em outro, discute-se o recente reconhecimento da diversidade linguística no Brasil como abertura para questões de ordem política e pedagógica ligadas ao ensino bi e plurilíngue. Experiências ligadas ao Ensino do P´urhepecha, Michoacán, México, do Pomerano no Espírito Santo, Brasil, e em Escolas das Regiões de Fronteira do Brasil com Paraguai e Bolívia, fornecem aportes para essa discussão.

Palavras-chave: educação bilíngue; diversidade linguística; interculturalidade.

Para maiores informações, acesse o site http://www.dialogosenmercosur.org/.

Fonte: e-Ipol